A oposição enxerga o episódio que forçou o governo a revogar a norma para ampliar a fiscalização de transações via Pix como um sinal de resistência a medidas propostas pelo Ministério da Fazenda para aumentar a arrecadação. Adversários de Lula (PT) pretendem explorar esse flanco para desgastar o petista até as eleições de 2026.
O governo Lula tem como um dos principais pontos da agenda legislativa para 2025 o projeto de lei que isenta de Imposto de Renda as pessoas físicas que recebem até R$ 5 mil por mês —uma medida que reduziria a arrecadação. O benefício, no entanto, seria compensado com a criação de um novo tributo sobre brasileiros com rendimentos superiores a R$ 50 mil mensais.
A proposta ainda não foi encaminhada ao Congresso e seus detalhes não são conhecidos, embora tenha sido divulgada no fim do ano para frear a repercussão negativa sobre o pacote de contenção de despesas.
A iniciativa de diminuir a carga tributária de quem ganha menos é vista, no Palácio do Planalto e no PT, como o trunfo para reverter a imagem de que Lula estaria apenas empenhado em aumentar a arrecadação do governo para poder gastar mais.
Há preocupação no mercado financeiro, contudo, de que apenas os benefícios sejam aprovados e que as medidas de compensação sejam rejeitadas, o que contribuiria para aumentar o déficit nas contas do governo federal. O governo Jair Bolsonaro (PL) tentou modificar o imposto de renda na reta final de seu mandato, mas o corte de impostos foi ampliado pela Câmara sem que medidas de equilíbrio fossem adotadas. O texto ficou parado no Senado Federal e nunca foi votado.
Outra medida de aumento de arrecadação que aguarda discussão pelo Legislativo é o projeto de lei que aumenta a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) e os Juros sobre Capital Próprio (JCP) caso as medidas de compensação à prorrogação da desoneração da folha de salários de 17 setores e de prefeituras pequenas não sejam suficientes para cobrir o impacto fiscal.
O texto foi encaminhado pelo Executivo ao Congresso em setembro e nem sequer foi despachado pelo presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), para que começasse a tramitar. A expectativa da Fazenda era arrecadar R$ 20,94 bilhões em 2025, mas essa estimativa já foi reduzida. No relatório de receita do projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA), a conta já caiu para R$ 13 bilhões.
Relator deste documento, o deputado Domingos Sávio (PL-MG) disse que seu desejo era ter cortado 100% da previsão de receita com essa medida, mas aceitou o argumento da equipe econômica para manter pelo menos parte da arrecadação. “Isso vai ser rediscutido, já que não aprovamos ainda o Orçamento. Você vir com mais aumento de imposto é mais um erro do governo”, afirmou. “As possibilidades [de aprovar] são mínimas”, declarou.
A norma da Receita Federal que buscava aumentar a fiscalização das pessoas físicas via Pix é um exemplo, afirmam parlamentares de oposição, de que as iniciativas para aumento da arrecadação enfrentarão mais dificuldades –e, mesmo que aprovadas, servirão para tentar fragilizar o governo Lula e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, diante do eleitorado.
Haddad é um dos potenciais sucessores do presidente dentro do PT caso Lula decida não concorrer em 2026. O ministro já entrou na mira da oposição, que tenta vinculá-lo à alta de impostos, espalhando memes nas redes sociais para chamá-lo de “Taxad”.
Em setembro, o Fisco editou uma instrução normativa para receber mais informações dos bancos sobre as transações com o Pix, com o objetivo ampliar a fiscalização sobre a sonegação de impostos e lavagem de dinheiro.
A oposição espalhou informações falsas de que se tratava de uma tentativa de taxar esse meio de pagamento. Depois, alguns desses personagens ajustaram o discurso para dizer que o governo queria fechar o cerco sobre pequenos empreendedores e a classe média, com o objetivo de ter mais dinheiro para gastar.
Um vídeo do deputado Nikolas Ferreira (PL-MG) alcançou mais de 200 milhões de visualizações e o fez ultrapassar o presidente Lula em número de seguidores no Instagram. O governo chegou a encomendar uma estratégia de comunicação para rebater os políticos de direita sobre o Pix, mas acabou recuando nesta quarta-feira (15), com a decisão de revogar a norma da Receita.
O episódio se soma a outros recuos em medidas de arrecadação, como na “taxação das blusinhas”, a partir do primeiro ano de governo. Naquele caso, a Receita Federal propôs acabar com a isenção para compras internacionais de até US$ 50 a pedido do varejo e da indústria. A iniciativa levou ao desgaste da imagem de Lula, que determinou a revogação da regra. A cobrança de Imposto de Importação só foi aprovada no ano seguinte, por iniciativa do Congresso e sancionada pelo petista.
Outra iniciativa que o governo Lula desistiu de implantar foi a volta do Danos Pessoais por Veículos Automotores Terrestres (DPVAT), seguro obrigatório para veículos automotores. Uma lei foi aprovada, sancionada e revogada em menos de um ano por causa da resistência dos governadores a assinarem o convênio para cobrar a taxa junto com o Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA).
noticia por : UOL