Estudos sobre o uso de cannabis medicinal no tratamento da doença de Parkinson indicam que a substância pode melhorar diversos sintomas da doença. No entanto, ainda são escassas as pesquisas com grandes grupos de participantes para confirmar se a cannabis é, de fato, responsável pela melhoria desses quadros.
Um dos estudos para entender o tema no Brasil foi conduzido por Marcos Hortes, especialista em psicogeriatria e docente da Faculdade de Medicina da USP.
“O que constatamos foi uma melhora no bem-estar emocional, juntamente com a diminuição do tremor”, afirma. Segundo o especialista, a escala de qualidade de vida específica para pacientes com Parkinson considera o bem-estar emocional como um dos pilares mais importantes do tratamento.
O estudo conduzido por Hortes aponta, contudo, que habilidades motoras, paladar e sono não apresentaram melhora significativa após o uso de cannabis para tratar o Parkinson.
Os dois principais canabinoides usados para tratamento médico atualmente são o CBD (canabidiol) e o THC (tetrahidrocanabinol).
Em outra pesquisa, o especialista analisou a ansiedade, sintoma comum entre os pacientes, e observou que, após uma dose de canabidiol, houve melhora no quadro. Nesse estudo, os pacientes apresentaram redução dos tremores associados à ansiedade —mensurados a partir de um acelerômetro—, embora sem evolução significativa de demais sintomas motores.
Além dos tremores, o Parkinson pode causar transtornos do sono e prejuízos cognitivos. Também pode provocar quadros de psicose, alucinações e delírios, sintomas que melhoraram após o uso de cannabis medicinal, segundo Hortes.
Apesar dos resultados positivos observados em alguns casos de psicose e ansiedade, o uso da substância para tratar o Parkinson ainda é considerado uma alternativa, ou seja, o último recurso quando os tratamentos convencionais não demonstram eficácia.
“Os ensaios clínicos bem-feitos que temos ainda são pequenos. E a maioria dos estudos não é controlada por placebo”, afirma. A pesquisa conduzida por Hortes, por exemplo, envolveu menos de dez participantes.
De acordo com o especialista, as indicações para o uso de cannabis no tratamento do Parkinson são, na prática, “off-label”, ou seja, interpretadas como alternativas não necessariamente eficazes para a doença.
Hortes ainda alerta que, assim como ocorre com qualquer medicamento, é importante estar atento aos riscos que o uso de cannabis medicinal pode trazer, especialmente no que diz respeito à interação com outras medicações usadas por pacientes com Parkinson.
“Quando falamos de maconha, estamos lidando com centenas de canabinoides que podem interagir com os medicamentos e causar efeitos colaterais”, explica.
Especialmente os pacientes que tomam medicamentos anticoagulantes devem estar atentos aos riscos. Nesse caso, o uso do canabidiol pode provocar reações inesperadas.
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O especialista ressalta ainda que o uso recreativo da substância apresenta efeitos diferentes daqueles observados quando ela é usada de forma terapêutica. Entre os efeitos colaterais estão queda de pressão, aumento do apetite, boca seca e, talvez mais grave, tontura, o que pode representar um risco maior de quedas para idosos e pacientes com doenças neurodegenerativas como o Parkinson.
Médico integrante da APMC (Associação Panamericana de Medicina Canabinoide) e da Ambcann (Associação Médica Brasileira de Endocanabinologia), Giuliano Robba diz que a cannabis não consegue curar alterações comportamentais provocadas por doenças neurodegenerativas, mas pode melhorar a qualidade de vida dos pacientes. Ele destaca ainda que a substância não deve ser utilizada sozinha, mas em conjunto com outros tratamentos.
“Sabemos que, para tratar sintomas como os de epilepsia, ansiedade ou dor, por exemplo, apenas com canabinoide o tratamento não será suficientemente eficaz”, afirma Robba.
Embora o uso de cannabis tenha riscos, o especialista ressalta que a segurança do medicamento é relativamente boa, especialmente quando comparado a substâncias como benzodiazepínicos e opioides, que podem causar overdoses fatais. “O fitocanabinoide não tem a possibilidade de causar a morte por overdose”, explica Robba.
A jornalista viajou a convite da SBGG (Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia)
noticia por : UOL