Práticas de cobranças abusivas em eventos e em faturas de serviços essenciais causaram polêmica nos últimos meses. Apesar de ambas as questões estarem previstas no Código de Defesa do Consumidor, o advogado Fábio Capilé, atuante na área do Direito Civil e do Consumidor, esclareceu que tratam de matérias totalmente diferentes. Ele explicou quando uma cobrança pode ser considerada abusiva e como o consumidor deve proceder nestas situações.
O advogado disse que no Brasil existem alguns órgãos de fiscalização sobre estas questões, sendo o PROCON um deles. Ele afirmou que, ao mesmo tempo em que o ente governamental atua na fiscalização, a iniciativa privada também cobra o respeito à liberdade de mercado e autonomia.
“É preciso ter um bom senso, ter a observância de princípios básicos relativos à boa fé e também para não exploração do consumidor. Então, dentro desta perspectiva, um aumento de preço, o estabelecimento de um valor excessivo, pelo menos aos nossos olhos, deve vir acompanhado de uma justificativa plausível”.
Uma polêmica recente, referente a preços altos, foi na partida entre a Seleção Brasileira de futebol e a da Venezuela na Arena Pantanal. Os ingressos eram cobrados por até R$ 600 e, a princípio, não era ofertada a meia-entrada. Após atuação do Ministério Público isso mudou. Capilé explicou que valor de cobrança alto não quer dizer, necessariamente, que é abusivo.
“No caso do Brasil não se trata de uma demanda alta, se trata de um custo que já vem sendo aplicado de forma reiterada em todos os jogos […] Tem toda uma estrutura por trás disso que pode justificar estes custos, o que não se justifica em partidas, por exemplo, do Campeonato Brasileiro, onde para um determinado jogo você cobra R$ 10, R$ 15 e para outro quer cobrar entre R$ 300 e R$ 500”, disse Capilé.
Em julho deste ano o MP chegou a entrar com uma ação na Justiça pedindo a redução no valor do ingresso para o jogo entre Cuiabá e Flamengo, que ocorreu em agosto. O órgão apontou uma elevação de mais de 400% no preço.
“O custo jogo, que motivaria uma cobrança dos ingressos, se ele vem sendo praticado ao longo de algum tempo, se já há um valor fixado para os valores, não há justificativa plausível para um aumento excessivo no preço, já que o custo já vem sendo arcado de forma normal com os valores que haviam sendo praticados […] No jogo do Cuiabá e do Flamengo queriam cobrar valores altíssimos, comparados a outros jogos”, afirmou o advogado.
No último mês de outubro outra controvérsia que surgiu, diferente da cobrança de ingressos, foi com relação aos preços dos produtos comercializados nas lanchonetes no Terminal Rodoviário de Cuiabá. Passageiros reclamaram que os valores estavam exorbitantes, sendo que o preço de alguns itens, inclusive, superava o de outros terminais ou até mesmo se assemelhavam aos de aeroportos.
Capilé relacionou este tipo de cobrança ao das praças de alimentação em shoppings centers, pontuando que é mais difícil comprovar a abusividade nestes casos.
“A tendência de valores em shoppings centers é que sejam maiores pelo fato de ter uma série de custos específicos que devem ser absorvidos pela própria mercadoria, então logicamente isso é repassado para o consumidor […] A não ser que seja uma coisa muito flagrante, é muito difícil aferir isso porque, querendo ou não, para demonstrar o aspecto da abusividade tem que trazer comparativos, para estabelecer que aquele preço está sendo praticado muito além do que realmente é. Por isso que a lei fala em abusividade, não fala em necessidade de tabelar todos os preços”.
Faturas exorbitantes
Apesar de também ser uma questão de preços abusivos, o advogado explicou que cobranças abusivas em faturas de fornecimento de energia elétrica ou água, são situações totalmente diferentes das cobranças em eventos esportivos ou culturais.
“Neste aspecto de fornecimento de energia, água ou o que for, estamos analisando falha na prestação de serviço, estamos lidando com aferição de consumo. Houve erro na hora de aferir um consumo ou houve dolo da instituição em querer cobrar mais? É outra natureza de problema, embora todos estejam enquadrados no Código de Defesa do Consumidor”.
Medidas cabíveis
O advogado explicou que tanto o PROCON, quanto o Ministério Público ou outros órgãos de fiscalização, podem agir de ofício, ou seja, sem que haja uma denúncia por parte de um consumidor ou entidade. No entanto, ele pontuou que é importante que, quem flagrar situações de cobrança abusiva denuncie, pois “havendo uma comoção social, é claro que vai haver uma resposta por parte destes órgãos de fiscalização”.
Com relação ao consumidor que se sentiu lesado por causa de alguma cobrança abusiva, o advogado esclareceu que pode buscar a Justiça diretamente ou pode, primeiro, buscar o PROCON.
Porém, ele aconselha que o consumidor busque o órgão público antes de ir à Justiça, em decorrência da prática de alguns magistrados.
“Tem alguns juízes, aqui em Cuiabá inclusive, que estão condicionando a apreciação da matéria à submissão primeiro ao PROCON, mas isso é uma prática abusiva, porque o Poder Judiciário é livre, não pode causar barreira para a pessoa poder acioná-lo”, disse o advogado.