Sir Jim Ratcliffe sabe como reverter a situação de um negócio em dificuldades. O bilionário britânico, agora responsável pela operação esportiva do gigante do futebol Manchester United, fez seu nome e sua fortuna comprando e revitalizando, ao longo de mais de duas décadas, empresas do setor químico com baixo desempenho.
Será que ele sabe, no entanto, como reverter a situação de um clube de futebol em crise? As evidências sugerem, cada vez mais, que não.
Nos três anos até 2024, o United acumulou perdas que totalizam mais de £ 300 milhões (R$ 750 milhões), o tornando o segundo clube mais deficitário da Premier League, atrás apenas do Chelsea —uma reversão notável em relação a uma década atrás.
Ratcliffe, que comprou cerca de 25% das ações do Manchester United no início do ano passado, poderia ter parecido uma escolha sensata como coacionista da família Glazer, dado seu histórico empresarial. Mas revitalizar um time de futebol requer mais que medidas corporativas padrão, como otimizar processos ou cortar custos. Exige mudanças culturais e estratégicas muito mais profundas. Isso fica evidente nas próprias demonstrações financeiras que Ratcliffe foi encarregado de reestruturar.
Não há mistério sobre por que as finanças do United se deterioraram tão rapidamente nos últimos anos. Do lado da receita, a exploração comercial e a renda dos jogos se manteve sólida. No entanto, as receitas de transmissão —em grande parte determinadas pelo desempenho do clube em campo— caíram significativamente.
Quedas prolongadas não são inéditas entre os gigantes do futebol, mas a duração e a profundidade do declínio do United são sem precedentes desde os anos 1980. Nenhum clube dominante caiu tanto.
A posição ruim do time na Premier League, por si só, deve resultar em uma perda de £ 46 milhões em receitas ao longo desta e da última temporada. O fracasso na qualificação para a lucrativa Liga dos Campeões gerou um prejuízo adicional de £ 90 milhões nos últimos três anos, de acordo com uma análise do especialista em finanças do futebol Kieron O’Connor. Se, como parece provável, o United não se classificar para nenhuma das competições europeias da próxima temporada, isso significaria a perda de mais £ 80 milhões em receitas.
Fatores relacionados ao futebol também explicam o aumento explosivo dos custos. A política de contratações do clube tem sido especialmente desastrosa, tanto dentro quanto fora de campo. O United gastou mais dinheiro com rescisões contratuais de treinadores e executivos na última década que qualquer outro clube da Europa, incluindo quase £ 30 milhões apenas nas últimas três temporadas.
Quanto aos jogadores, o cenário é ainda pior. Mais da metade das contratações mais caras do clube na última década foram fracassos, com esses atletas passando menos de um terço do tempo disponível em campo.
Esse é um desempenho pior que o de qualquer outro grande clube da Europa e representa o desperdício de dezenas de milhões por ano. Nenhum clube tem um histórico impecável no mercado de transferências, mas o United acumula um custo contábil anual de £ 81 milhões com jogadores que não estão ativos em campo —aproximadamente o dobro da média dos clubes concorrentes, tanto no Reino Unido quanto no exterior.
O mais alarmante é que o valor de mercado dos jogadores contratados pelo United tende a se depreciar quase imediatamente após a chegada, em vez de aumentar, como ocorre com a maioria dos clubes rivais. Seja um indicativo de que o clube está pagando preços excessivos ou de que seus problemas em campo estão prejudicando o desempenho dos jogadores em Old Trafford, os dados revelam uma situação preocupante.
Nos últimos três anos, somando as perdas anuais de £ 45 milhões em receitas de transmissão devido a maus resultados, £ 5 milhões em indenizações por contratações malsucedidas de treinadores e executivos e mais £ 40 milhões desperdiçados em taxas de transferências, se chega a um custo total de £ 90 milhões por temporada devido à disfunção do clube —o que equivale a quase 90% das perdas anuais do United no mesmo período.
As soluções mais notáveis propostas por Ratcliffe até o momento no lado dos negócios envolveram a redução de custos, com o corte de funcionários não ligados ao futebol e a eliminação de almoços gratuitos para a equipe do clube. No entanto, cortes de custos corporativos tradicionais não abordam as causas reais da deterioração do clube, tanto em campo quanto nas finanças. A turbulência no departamento esportivo impediu qualquer estratégia coesa sobre a identidade do clube e a política de contratações de jogadores.
Ratcliffe contratou um novo técnico em novembro passado, mas os resultados mal melhoraram, se não pioraram. O declínio contínuo em campo facilmente anulará qualquer economia obtida com cortes pontuais de despesas.
noticia por : UOL